Publicado no G1 em 11/09/09 às 18h41
Keen criticou modelo de internet com conteúdo gerado pelos usuários.
Escritor inglês participou de debate com Caio Túlio Costa na Bienal.
Do G1, em São Paulo
Keen, autor do livro “O culto ao amador”, em que critica a chamada web 2.0, acredita que sites com conteúdo gerado pelos usuários não são tão confiáveis quanto a mídia tradicional.
Ele citou um exemplo de Milton Friedman, que conheceu uma mulher que não tinha votado no candidato democrata Al Gore nas eleições nos EUA em 2000. “Não votei nele porque ele é judeu”, teria dito a mulher.
Intrigado com o argumento (Gore não é judeu), ele perguntou onde ela teria “descoberto isso”. “Eu li na internet”, foi a resposta dela.
Segundo Keen, é por situações como essa que ainda é importante a figura do mediador – especialmente aqueles vindos da mídia tradicional. “São eles que conseguem separar e checar informações, estão treinados para isso. Eles devem ser tão profissionais quanto um médico ou um piloto de avião em que confiamos.”
Costa, autor de “Ética, jornalismo e nova mídia”, concorda com o inglês, dizendo que Keen “é um exemplar típico do intelectual atônito com o que está acontecendo”. “É uma situação de mudança, nova e vivificadora”.
Google e os anúncios
Keen defendeu também que os usuários devem aprender a ler criticamente o material encontrado na internet. “Nos EUA as pessoas têm preguiça, esperam tudo mastigado. E chegar a informações confiáveis na internet dá trabalho. A parte tecnológica é fácil de aprender, mas agora elas têm que aprender a ler criticamente”.
Perto do final do debate, uma questão de Costa inflama uma discussão. O jornalista compara o modelo tradicional da TV aberta ao Google, que conseguiu ser bem sucedido vendendo anúncios na internet.
Keen discordou. Para ele, “o Google ‘comodificou’ os anúncios na internet. Isso baixou dramaticamente o valor deles, e ninguém mais consegue ganhar dinheiro com anúncios, e por isso, não podem produzir conteúdo. Isso não é problema para o Google, que não paga pelo conteúdo que disponibiliza.”
Banalização da cultura na era da rede global
Caio Túlio Costa e Andrew Keen discutiram em 11 de setembro de 2009, das 17 horas às 18h15, no Café Literário da XIV Bienal Internacional do Livro, no Rio de Janeiro.
Kenn é autor de O Culto do Amador, recém-editado pela Zaar, a mesma editora de Ética, jornalismo e nova mídia, de Caio Túlio, lançado em março de 2009.
Após o debate, ambos os autores autografaram os livros no estande da Zahar.
Repercussão:
Veja o que se escreveu sobre a expectativa em relação a este debate, no Globo Online em 08/09/2009 às 10h21m:
Bienal do Livro terá debate sobre a banalização da cultura na rede global
Nelson Vasconcelos
RIO – Promete ser interessante, para quem acompanha as tendências do mercado de tecnologia e mídia, o debate “Banalização da cultura na era da rede global”, na próxima sexta, às 17h, na Bienal do Livro do Rio. Estarão na mesa o jornalista e escritor Caio Túlio Costa – autor de “Ética, jornalismo e nova mídia”, entre outros – e o escritor britânico Andrew Keen, de “O culto ao amador”.
Já comentamos aqui na coluna a obra do Keen. No livro, que saiu no Brasil pela Editora Zahar, ele se mostra bastante pessimista com o fato de a interatividade via internet dar voz a tantos homens gentis que, no fundo, mostram que não têm nada a dizer de importante ou construtivo.
Ainda de acordo com o Keen, esse espaço aberto à manifestação de todos, principalmente nos grandes sites, provocaria uma certa queda na qualidade da informação e da opinião geral. No fim das contas, digamos que a Humanidade esteja deixando para trás os debates de alto nível, tomando o rumo do emburrecimento irrestrito ou da desinformação generalizada.
É basicamente essa a ideia de Keen, que se mostra preocupado até com o desemprego de jornalistas e outros profissionais ligados à mídia tradicional, que estariam perdendo espaço para blogueiros e internautas em geral.
(A propósito, o jornal “New York Post” estaria proibindo seus repórteres de creditarem material vindo de blogueiros. Medo da concorrência? Veja em http://www.niemanlab.org/2009/09/new-york-post-prohibits-crediting-blogs-for-scoops/ )
E o que o Caio Túlio Costa diz sobre Keen?
– Ele tem bastante razão nas críticas que faz. O Andrew coloca o dedo bem na ferida e nos problemas, nas questões e nas mudanças que a tecnologia vem exercendo. Ele está preocupado com a a banalização cultural – diz Caio à coluna.
Haverá, portanto, pontos em comum entre os debatedores na Bienal. Mas Caio levanta uma ideia:
– Ainda estamos engatinhando no entendimento dessa nova realidade social e política. Não estamos conseguindo entendê-la totalmente porque estamos no olho do furacão, vivendo mudanças estruturais da comunicação, já que hoje o indivíduo tem poder de mídia. Pode não ter alcance, ou audiência, mas o poder ele tem.
Taí uma boa questão a ser discutida: será que o internauta está aproveitando mesmo o poder que as chamadas novas mídias lhe permitem exercer?
Tenho dúvidas. Gosto, até por necessidade, de acompanhar os comentários de leitores nos grandes sites e blogs. Boa parte do que está ali se resume a lamentações, críticas a esmo e gracinhas inócuas – frequentemente, com um toque de irresponsabilidade. O achismo é a grande força por trás dos argumentos – que tendem a ser mais bem estruturados quando o site em questão é mais especializado.
Mas, lembremos o que diz o Caio Túlio, ainda estamos engatinhando nesse novo tipo de manifestação. A bronca é livre.
– Essa questão da irresponsabilidade é muito forte, mas não vamos fazer juízo de valor. A própria configuração da rede, com sua facilidade de comunicação, influencia de forma cabal e irreversível essa irresponsabilidade, no sentido de (o internauta) não pesar as palavras. Mas temos que conviver com isso. O contrário seria a censura – diz o jornalista brasileiro, lembrando que a internet também acelerou certa assimetria. – A rede dispersa indivíduos por um lado, mas concentra por outro. Ao mesmo tempo, aprofunda o fosso entre quem sabe mais e quem sabe menos.
Por essas e por outras, a conversa do próximo dia 11, no RioCentro, promete bons momentos. Andrew Keen, o irredutível pessimista, vai defender suas ideias. Mas Caio Túlio Costa, que o considera realista, haverá de defender a minha, a sua, a nossa internet de cada dia.
– Acho que é um processo de mutação cultural, mas não vejo a internet como um problema, como o Keen eventualmente aponta – diz ele, para quem a internet é “a mãe de todas as mídias”.
A Lei Romário
A coluna aposta: este ano não sairá livro sobre tecnologia mais instigante que “O tiro e o alvo – Aforismos para resolução de problemas de negócios”, de Horácio Soares Neto. Reúne trocentos aforismos ao melhor estilo dos bons pensadores: fazem refletir, conduzem a mudanças. O livro trata do uso – ou mau uso – da tecnologia no mundo dos negócios.
Horácio sabe do que está falando. Ele é analista de sistemas e professor da área há mais de 40 anos. Já viu de tudo, já fez de tudo. Agora está tirando da cartola algumas provocações que merecem atenção por parte de gestores e, principalmente, da turma que está começando. Ele parte da ideia de que devemos estar mais atentos à observação dos problemas. E evitar os manuais com procedimentos preconcebidos.
São coisas simples, mas que passam despercebidas. É o caso da Lei Romário:
“Em termos tecnológicos, um ano é uma eternidade, e tudo pode mudar (…). Quando uma empresa reconhece estar atrasada tecnologicamente em relação ao mercado, é natural que desenvolva um projeto de mudança para alcançar a concorrência. No entanto, ao atingir o patamar previsto, seus concorrentes já terão dado passos à frente. Por isso, quando se estabelecerem alvos de mudança, deve-se agir como o Romário. Enquanto atacantes comuns correm para onde a bola está, o Baixinho corre (ou corria) para onde a bola vai estar”.
Será que todo gestor pensa assim? Passeando entre a filosofia e a tecnologia, Horácio bate um bolão.
Em tempo: o livro sai pela < http://www.caispharoux.com.br/ >.