Nova mídia apresenta desafios para imprensa
Uma das conclusões a que chego quando examino o uso das novas mídias pela publicidade é a mesma quando analiso a maneira como produtos da tradicional mídia impressa aparecem na nova mídia. São reproduções exatas de títulos, sub-títulos, textos, fotos…No máximo, os conteúdos ganham complementos e extensão, porque na internet o espaço é mais barato. Os assuntos são transpostos mecanicamente para as telas, sem preocupação nem com o novo suporte nem com o principal, o jeito pelo qual sua excelência, o consumidor, lida com elas.
O assunto ganha cada vez mais relevância porque a indústria da mídia engatinha no seu desenvolvimento digital. Quem não se levantar e andar, agora, vai perder a corrida num tempo que encurta a cada segundo e exige rapidez de tomada de decisão para investimentos na construção de um outro modelo, no qual as ferramentas de interação darão o tom. Para ficar em dois exemplos, compare o valor de mercado de uma vetusta companhia de mídia, a Time Warner, US$ 76 bilhões, contra o valor da jovem e interativa Google, US$ 119 bilhões.
A incapacidade para lidar com muita informação e muita transformação leva a uma desinteligência na adaptação para um novo modelo de comunicação, aliada a uma leitura equivocada dos ensinamentos, segundo os quais o meio é a mensagem.
As comunidades virtuais se formam e se fundam numa maneira distinta de ver, escrever, interagir e aprender. Os métodos usados pela velha mídia fantasiada de nova teimam em reproduzir o clássico modelo da comunicação, como notou muito bem o executivo e scholar canadense Joe Pilotta em artigo publicado na web (What’s new about new media?). Ele reclama que a comunidade da propaganda – e da mídia tradicional, acrescento eu – continua agarrada àquele modelo danificado para o qual a comunicação se dá em cinco fases: fonte, transmissor, sinal, receptor e destinatário.
Serei mais claro e os argumentos seguintes se inspiram no raciocínio do Pilotta. Não bastam banners arquitetados com a mais recente das tecnologias que o fazem pular, dançar, abrir-se, tocar música, derramar-se, desconstruir-se e implorar por um “clique aqui”. Pouco valem “links patrocinados” no aparente lugar e momento certo ou malas diretas eletrônicas, ainda que com retorno equivalente ao das malas diretas tradicionais. Nada disso conseguirá o devido e grandioso retorno na nova mídia, se os conteúdos continuarem transpostos como se a comunicação ainda se desse na base de que nada acontece à mensagem própria, com exceção da sua própria transferência ao destinatário.
Ainda se imagina uma separação entre canal e conteúdo, que a mensagem precede a transferência e que a contribuição do meio de distribuição seria evitar o ruído, a distorção da mensagem original. Ou que os sujeitos que se comunicam estão pré-determinados e não seriam realmente afetados pelo processo de comunicação, que eles simplesmente emitem e recebem mensagens.
O fato mais assustador é que as novas mídias viram de ponta cabeça a comunicação. As possibilidades interativas que carregam os aparelhos celulares, os computadores, os dispositivos de jogos e de música e, em breve, a televisão digital exigem muito mais reflexão, compreensão e criatividade do que revela a capacidade criativa dos criativos. Por mais incrível que possa parecer, o velho homem de mídia Rupert Murdoch colocou o dedo na ferida ao citar o “media man” Jeff Jarvis: “Dê às pessoas o controle da mídia, elas o usarão. Não dê às pessoas o controle da mídia, você as perderá”.
O desenvolvimento das novas tecnologias de comunicação é de fato um processo que faz alterar continuamente o ambiente. Não pode ser visto como se fosse capaz de decepar as capacidades humanas e delegá-las à mídia. No começo, a televisão era feita como um rádio com a imagem do locutor. A internet é rica porque pode misturar texto, foto, áudio e vídeo na tela do computador à sua maneira, de uma forma que o pessoal mais velho não entende, mas a criança a intui e navega sem manuais.
A publicidade hoje usa a nova mídia como fez com a televisão no seu início. Só que a televisão levou algumas décadas para se erigir no que é. Vem de um tempo em que o mundo tinha tempo.
Artigo originalmente publicado no Meio&Mensagem, número 1207, de 8 de maio de 2006, na pág. 10.