Marina atingiu 12,5 milhões de pessoas na web

PUBLICADO NO BLOG DE FERNANDO ROGRIGUES, NO UOL, ÀS 14h04 DE 14/04/2011

Maior herança virtual é o cadastro de 1.008.723 e-mails ativos

Fernando Rodrigues

Marina Silva (PV) conseguiu enviar sua mensagem no ano passado para 12,5 milhões de pessoas por meio da web. Ela ficou em 3º lugar na disputa e teve 19,6 milhões de votos.

Os dados estão em um artigo de Caio Túlio Costa sobre o desempenho da candidata presidencial do Partido Verde. Saiu na revista “Interesse Nacional”. Pode ser baixado em versão pdf aqui. Caio Túlio é jornalista, foi um dos pioneiros da internet no Brasil e coordenou a campanha digital de Marina em 2010.

Não há como saber quantos dos 19,6 milhões de votos de Marina tiveram conexão com os 12,5 milhões de internautas que receberam a mensagem da campanha de alguma forma. O número é citado na página 2 do artigo. Na página 12, Caio Túlio menciona que durante a campanha calculou-se que “as chances teóricas indicavam a possibilidade de levar a mensagem, direta ou indiretamente, a 14,9 milhões de pessoas. Nesta conta, não foram levadas em consideração as comunidades não oficiais”.

Esse cálculo de quantos cidadãos foram atingidos pela mensagem de Marina na web levou em consideração cruzamentos da audiência de todos os meios on line usados pelos marinistas _redes sociais, blogs, e-mails etc.

Embora Caio Túlio enfatize no início de sua análise esse número total de internautas que foram atingidos diretamente pela mensagem de Marina, há outra cifra relevante no final da página 12 (o artigo tem 23 páginas). Trata-se da “herança” política de Marina no mundo virtual, o banco de dados que restou com os nomes e endereços de cerca de 1 milhão de militantes que voluntariamente se alistaram para continuar em contato mesmo depois da campanha de 2010. Essa é a grande jóia que um político pode ter: cidadãos que se alistam de forma espontânea por acreditarem na causa.

“[É] um banco de dados que soma exatos 1.008.723 endereços distintos e diretamente alcançáveis de pessoas dispostas a repercutir de alguma forma a mensagem de Marina Silva, a qualquer momento, seja via e-mail ou por meio de endereço de alguma das redes sociais”, escreve Caio Túlio Costa.

Nos EUA, embora o uso de redes sociais tenha se disseminado e o e-mail seja hoje considerado uma forma de comunicação de velhos (ou de uma massa populacional não tão inserida na vida digital), a ferramenta de mensagens eletrônicas continua poderosíssima.

Por exemplo, um candidato presidencial pode descobrir em pesquisas que não vai bem no eleitorado feminino de 30 a 50 anos na região Sudeste. Se tiver uma base de e-mails consistente, esse político pode preparar uma mensagem direcionada aos eleitores desse estrato social –e pedir que ajudem na campanha. Barack Obama usou e abusou dessa técnica em 2008 nos EUA.

Diante dessas possibilidades em futuras campanhas, o número de e-mails obtido por Marina Silva pode ser considerado, ao mesmo tempo, modesto e relevante.

É modesto porque 1.008.723 de pessoas num universo de mais de 135 milhões de eleitores (o que tem o Brasil) é muito pouco.

Por outro lado, é um ponto de partida enorme na comparação com outros políticos e partidos brasileiros. Não existe política de manutenção de bancos de dados de e-mails sofisticados em nenhum dos 27 partidos brasileiros. Nem no PV, de Marina Silva.

Tome-se o caso do PT e de Dilma Rousseff, cujo potencial seria para ter milhões de e-mails cadastrados, com nome, endereço, sexo, idade, local de moradia e até dados sobre interesses pessoais de cada militante. Lula foi o presidente mais popular da história recente do país. Se ele tivesse pedido e atuado de maneira ativa nessa área, quantos seguidores não teria obtido para o PT?

Os petistas no início da campanha de 2010 começaram a coletar as bases de e-mails das seções regionais da legenda. Concluíram que tinham perto de 12 milhões de endereços eletrônicos cadastrados. Uma enormidade. Barack Obama teve 13 milhões de e-mails “quentes” em 2008.

Só que quando o PT começou a verificar os dados, percebeu alto grau de inconsistência. Quase tudo era lixo. A campanha de Dilma demorou seis meses para ter 200 mil endereços “quentes”. Terminada a eleição, a petista contava com cerca de 1 milhão de e-mails –um número semelhante ao de Marina Silva, cujo partido e os recursos foram infinitamente mais modestos. Mais precisamente, conforme o Blog apurou, Dilma tem hoje 1.163.625 endereços eletrônicos cadastrados (que são raramente usados; portanto, trata-se de uma base sem manutenção e que rapidamente vai se deteriorar, virar lixo).

O texto preparado por Caio Túlio Costa é uma grande contribuição para quem deseja entender um pouco de como se deu o processo de campanha eleitoral via web no Brasil em 2010. Seria muito útil se o PT e o PSDB oferecessem também suas análises detalhadas sobre as campanhas de Dilma Rousseff e de José Serra, respectivamente.

No caso de Dilma, há um relatório epidérmico e marqueteiro preparado pela Blue State Digital, a empresa norte-americana que prestou serviços ao PT em 2010. Para acessar esse trabalho, clique aqui.

Eis 3 dados que a Blue State Digital cita sobre Dilma e uma comparação com Marina:

E-mails cadastrados:

Dilma: “em menos de 6 meses, mais de 200 mil pessoas se cadastraram”, diz a BSDigital. Hoje, apurou o blog, são 1.163.625 e-mails cadastrados.

Marina: 1.008.723 de cadastros

Twitter (14.abr.2011):

Dilma: 536,9 mil seguidores

Marina: 429,1 mil seguidores

Financiamento de campanha via web:

Dilma: 2.032 doações e R$ 180 mil arrecadados (o valor exato não está disponível; a cifra se refere ao total arrecadado, para os 2 turnos)

Marina: 3.095 doações e R$ 170.527,75 arrecadados (o valor se refere ao que entrou até o 1º turno)

Arrecadação de campanha

Esse é um aspecto que indica um dos maiores fracassos da campanha eleitoral digital no Brasil.

Como se observa nos dados acima, os números de Dilma e Marina não são modestos. São medíocres e quase desprezíveis. José Serra (PSDB) simplesmente desistiu de arrecadar via web.

Diversos estudos a respeito do tema nos EUA indicam que o doador individual torna-se um militante ainda mais qualificado do que aquele interessado apenas em se cadastrar voluntariamente para receber e-mails. O doador via web passa a ser também um torcedor do candidato. Afinal, investiu dinheiro no projeto. Mesmo que a quantia seja de R$ 10, R$ 20 ou R$ 50, aquele cidadão não vai se esquecer.

Há também o benefício posterior para a sociedade. Um doador de campanha vira um cobrador de responsabilidade do político eleito. A abulia histórica do eleitor depois do processo eleitoral é conhecida. Mas é sempre mais provável que alguém que tenha doado R$ 50 passe a cobrar ações de um prefeito, deputado, governador ou presidente. Enfim, arrecadar dinheiro via web ajuda a sofisticar a cidadania e a democracia no país.

Há razões muito claras e objetivas para o fracasso da arrecadação de dinheiro por meio da web no Brasil.

A mais evidente (e sempre usada pelos políticos) é que o calendário eleitoral no Brasil os proíbe de arrecadar antes de a campanha ter sido oficializada, no mês de julho do ano eleitoral. Como a eleição é sempre no primeiro domingo de outubro, são menos de 3 meses para convencer eleitores a doar. Um tempo exíguo.

Tudo isso é verdade. Mas também é um sofisma.

Para começar, quem faz a lei são os políticos. Eles decidiram que o calendário brasileiro seria dessa forma, engessado. É algo até surrealista. Por exemplo, a campanha tem dia marcado para começar. OK. Mas ninguém pode arrecadar antes. Então, como pode a campanha começar se ainda não arrecadou recursos? É um despautério que todos sabemos como é resolvido na prática –muito políticos arrecadam por debaixo do pano para terem fundos disponíveis no dia em que começam oficialmente a fazer campanha.

Aliás, esse era um aspecto a ser alterado na atual safra de reforma política. Mas, por óbvio, ninguém toca nesse assunto para valer. Estão todos felizes com os arranjos conhecidos.

Apesar da limitação da lei eleitoral, o fato é que no Brasil nada impede partidos políticos de arrecadar dinheiro a qualquer tempo e época, nos 365 dias do ano. Qualquer agremiação pode fazer campanhas constantes para que seus militantes reais (eles existem?) contribuam voluntariamente, via web. Não há notícia de alguma legenda que faça isso no momento.

Marina Silva, Dilma Rousseff, José Serra, enfim, qualquer político, poderia aparecer nas propagandas de seus partidos na TV pedindo dinheiro para as suas legendas. Isso é muito comum nas campanhas dos EUA. Mas qual político no Brasil teria coragem de ir assim tão longe?

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